Medidas de austeridade em curso, projetos aguardando votação e um conjunto de propostas prestes a ser enviado à Assembleia podem render pelo menos R$ 2 bilhões extras ao caixa do Estado até o fim de 2015 – e, no mínimo, mais R$ 2,3 bilhões no próximo ano. Apesar de importantes para amenizar a crise, os valores serão insuficientes para tirar as finanças do vermelho antes de 2017 e para solucionar em definitivo as dificuldades de pagamento dos servidores.
Na última sexta-feira, sem condições de arcar com a folha de julho, a cúpula do Piratini anunciou o parcelamento dos contracheques acima de R$ 2.150. A decisão revoltou os funcionários públicos. Na segunda-feira, muitos deles paralisaram atividades e disseminaram uma onda de protestos pelo Rio Grande do Sul.
O governo espera que a gravidade da situação sensibilize os deputados e force a aprovação do novo pacote em gestação – parte deverá se apresentada até sexta-feira. A maioria das ações terá reflexos apenas a partir de 2016. Se as previsões se confirmarem, somente três terão impacto concreto ainda neste ano, sendo que duas já estão em andamento.
Uma delas é o decreto de contenção de gastos assinado pelo governador José Ivo Sartori em janeiro e prorrogado até dezembro. A outra é a revisão do orçamento de 2015, com diminuição média de 21% nas verbas das secretarias. Ambas tendem a gerar economia de R$ 1,07 bilhão, de forma pulverizada.
A terceira iniciativa, com efeito mais imediato e significativo, é a ampliação do limite de saques dos depósitos judiciais de 85% para 95% do saldo. Se autorizada, a alternativa permitirá a injeção de R$ 1 bilhão no Tesouro estadual.
Como a proposta será encaminhada ao parlamento em regime de urgência, terá de ser votada em 30 dias. Com isso, o dinheiro poderá ser sacado em setembro e ajudará a pagar o funcionalismo sem atrasos por três meses (a cada mês, faltam cerca de R$ 360 milhões). O principal problema será superar os entraves em agosto, provavelmente o período mais difícil do ano, já que não haverá nenhuma saída para o rombo. O ponto de corte para o parcelamento dos salários poderá cair para R$ 1 mil.
Na prática, as deficiências financeiras devem prosseguir pelo menos até 2016, sem contar que não há garantia de aprovação de todos os projetos. Em janeiro, técnicos do Piratini previam que o Estado gastaria R$ 5,4 bilhões além da arrecadação em 2015. Com os R$ 2,07 bilhões complementares (economia e depósitos), o rombo será menor, mas a conta continuará negativa em cerca de R$ 3,3 bilhões. Caso se concretize, será o maior déficit registrado desde 1985, na administração de Jair Soares. Na época, as despesas superaram as receitas em R$ 6,55 bilhões (em valores atualizados). O período foi marcado por profunda crise econômica, aumento de gastos com pessoal e rolagem de dívidas antigas que geraram uma bola de neve.
Perspectivas são piores para 2016
Será mais complicado para o governo assegurar os R$ 2,3 bilhões extras previstos para 2016. Motivo: 85% do valor depende da elevação das alíquotas do ICMS, medida que deverá ser proposta nos próximos 15 dias. Última a tentar o tarifaço, a governadora Yeda Crusius (PSDB) fracassou. Por enquanto, não há consenso sobre o tema nem entre os deputados do PMDB, partido de José Ivo Sartori – que, aliás, havia se comprometido a não aumentar impostos. Apesar disso, a cúpula do governo avalia que o cenário caótico contribuirá para a aprovação.
Mesmo contando com essa fonte de recursos, o Piratini terá de encontrar outra forma de engordar a arrecadação. O déficit previsto para 2016 é de R$ 6,1 bilhões, ainda maior do que o de 2015.
Uma alternativa, na avaliação do economista Alfredo Meneghetti Neto, professor da PUCRS, seria reforçar a fiscalização na cobrança de impostos:
– Em 2010, o Estado tinha 16 postos fiscais fixos. Hoje, são apenas seis. É o tipo de corte que não deveria ter sido feito.
Outras medidas com impacto financeiro a partir de 2016 – que estão em tramitação na Assembleia – são o aumento do Imposto sobre Doações ou Transmissões Causa Mortis (ITCD) e a redução dos "créditos presumidos", incentivos fiscais destinados a atrair investimentos.
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Outras ações
O governo apresentou ou vai apresentar medidas sem repercussão imediata, mas que, em longo prazo, tendem a amenizar a crise financeira. Confira as principais:
Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual
Projeto enviado à Assembleia para criação de lei visando ao equilíbrio financeiro, com regras para limitar crescimento da despesa.
Limites à incorporação de FG
Proposta em tramitação impede que o servidor público incorpore função gratificada (FG) para fins de aposentadoria, se tiver obtido o benefício ao exercer o cargo em outro poder.
Licença-prêmio, só para quem fizer curso
Proposta sugere que a licença-prêmio seja autorizada só se o servidor usar o período do benefício para fazer curso de capacitação.
Câmara de Conciliação de Precatórios
O novo órgão viabilizaria o pagamento de precatórios por acordo direto com os credores, com deságio de até 40% da dívida.
Alteração na previdência do funcionalismo
Quem ingressar no serviço público terá de contratar previdência complementar se quiser receber acima do limite do INSS (R$ 4,6 mil).
Revisão das estruturas de fundações
O governo estuda extinguir, fundir ou incorporar a secretarias instituições públicas de segundo escalão. Estão em análise 20 fundações em atividade.