Patrícia Comunello
FREDY VIEIRA/JCBenevides demonstrou modelo que fez a receita aumentar em 160%
A previsão de déficit de R$ 5,4 bilhões do Estado vai exigir um plano claro sobre o que fazer no dia seguinte aos cortes de gastos, anunciados nessa quinta-feira pelo governador José Ivo Sartori. O alerta foi feito pelo secretário estadual da Fazenda do Ceará, Mauro Benevides Filho, que desfilou o modelo que fez a receita pública cearense aumentar 160% em sete anos, enquanto a inflação do período ficou abaixo de 60%. O feito transformou Benevides Filho em atração do evento organziado pelo Afocefe Sindicato dos Técnicos Tributários do Estado, realizado nessa quinta-feira no anfiteatro Dante Barone da Assembleia Legislativa, em Porto Alegre. O convidado opinou que a solução mais imediata e que pode gerar resultados será o Rio Grande do Sul buscar o alongamento do prazo de pagamento da dívida com a União.
Benevides Filho disse que o foco tem de ser ainda maior na despesa do que só na receita neste momento, e que é preciso engatilhar outras ações, para que o ajuste não seja em vão. No Ceará, uma das ações foi negociar com setores produtivos a redução de alíquotas dependendo de metas estabelecidas para a geração de receitas. "Foco em resultados", traduziu o secretário cearense. Benevides Filho é o artifície da escalada do seu estado no ranking dos investimentos das unidades da federação. No período de 2007 a 2014, o Ceará ficou em quarto lugar nos aportes, com quase R$ 16 bilhões. O chefe da Fazenda daquele estado avisou que vai ultrapassar Minas Gerais, terceiro lugar, em 2016. O Rio Grande do Sul, por sua vez, somou R$ 7,5 bilhões e ficou em 16º lugar. O Estado ostenta ainda a maior taxa de endividamento, segundo Benevides Filho.
O governador, que deu uma passada no seminário após comunicar os cortes de gastos e metas de economia, disse que a aplicação do novo indexador para corrigir o passivo depende hoje da União e garantiu que está conversando com o governo federal para aumentar o prazo de quitação do débito, de mais de R$ 45 bilhões. "Mas depende deles (governo federal)", condicionou o chefe do governo gaúcho, com certa impaciência ao ser cobrado sobre a negociação. Admitindo que não definiu as próximas medidas para recompor o caixa, Sartori evitou falar sobre o que fará para aumentar a arrecadação. Sobre as desonerações fiscais a setores e adoção de metas de resultados, caminho adotado no Ceará, o governador acabou transferindo a pauta à política de redução de alíquotas que a União aplicou a setores e que afetou receitas para os estados e os municípios.
Benevides Filho admitiu que medidas como redução de despesas, que ele considerou inevitáveis diante da condição das finanças, costumam não ser compreendidas pela população. O secretário cearense valorizou o caminho da transparência repetido incansavelmente por Sartori e advertiu apenas que tem de haver perspectiva sobre o futuro. "Fazendo isso, vou chegar ali, para que a população tenha segurança para cobrar lá na frente", resumiu o gestor cearense.
O palestrante defendeu ainda a montagem de uma estrutura para buscar recursos que "vazam" (para não dizer que são sonegados), sem ter de elevar impostos. "Insisto. Não pode ser só no âmbito da receita, tem de acompanhar a despesa", recomendou o cearense, que citou ter feito a ressalva a integrantes do governo gaúcho. E a cautela ganha mais relevância em ano de economia desacelerada, caso de 2015. O governador repetiu à plateia o pedido de solidariedade para as medidas anunciadas. "Esperamos chegar a um equilíbrio, mas não é uma questão de um homem só, uma equipe ou um governo", reforçou Sartori.
Sobre medidas na área de operação da Fazenda, o governador disse que estão sendo retomadas operações na rua, que teriam sido desativadas "há muito tempo". "Recuperar essa capacidade vai precisar de tempo e aprendizado, como se fosse começar tudo de novo", dimensionou, indicando que serão necessárias ferramentas mais modernas para reduzir a sonegação. Sartori sugeriu que as medidas já reveladas não serão as únicas, mas preveniu que fará tudo pausadamente. "Não somos de fazer espetáculo ou show."
Técnicos tributários defendem o reforço da estrutura para ampliar a capacidade de arrecadação
O tom do evento que lotou o anfiteatro Dante Barone, da Assembleia Legislativa, foi de buscar caminhos tradicionais para ampliar as possibilidades de tirar as finanças da UTI. Mais fiscalização, e estrutura para isso, foi uma unanimidade entre os dirigentes.
O presidente da Afocefe Sindicato dos Técnicos Tributários-RS, Carlos De Martini Duarte, indicou que o Rio Grande do Sul perde, ano a ano, posições na capacidade de gerar receitas e que uma das razões é a mudança na gestão a cada quatro anos, o que acaba mexendo na condução da pasta da Fazenda. "Fala-se em cortes ou fontes alternativas (como financiamentos), mas nada se diz de fontes tradicionais de receitas - será que estão esgotadas?", provocou Duarte, que defendeu claramente a busca de exemplos de outros estados, como do Ceará e Pernambuco, convidados a mostrar os feitos na Capital. A entidade criticou a redução de postos fiscais e disse que mais técnicos nas ruas não é despesa, e sim mais receita.
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