Sonegação fiscal e alta tributação perturbam
Editorial Jornal do Comércio - 26 de setembro de 2013
26/09/2013
Há alguns anos, um líder empresarial afirmou que, no Brasil, sonegar
impostos era um ato de legítima defesa, em face da carga tributária que
imperava no País. Se existem muitos impostos, temos que trabalhar pela
simplificação e diminuição dos existentes, e não sonegar, pois dois
erros jamais farão um acerto. Os brasileiros já teriam sonegado R$ 303
bilhões em tributos em 2013, segundo estimativa do Sindicato Nacional
dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz). Até o fim do ano, o
valor atingirá R$ 415 bilhões, o equivalente a 10% do Produto Interno
Bruto (PIB). O Sinprofaz desenvolveu um placar online da sonegação
fiscal no Brasil, nos moldes do Impostômetro, da Associação Comercial de
São Paulo, que marcou, dia 24 de setembro, cerca de R$ 1,1 trilhão.
Chamada de Sonegômetro, a ferramenta permite acompanhar uma estatística
em tempo real de quanto o País deixa de arrecadar todos os dias. A
questão é: em que dados concretos baseou-se o trabalho? Ou é apenas uma
simulação teórica, uma possibilidade? Mas, piorando o quadro, enquanto a
proporção da carga tributária em relação ao Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro passou de 25% em 1994 para os atuais 36%, o investimento
público permaneceu com participação de apenas 2,5%.
Se não
houvesse sonegação de impostos, o peso da carga tributária poderia ser
reduzido em até 20% e, ainda assim, o nível de arrecadação seria
mantido. A quantia sonegada, segundo ainda o Sinprofaz, equivale a mais
do que a riqueza produzida pelo Rio Grande do Sul, de R$ 252,5 bilhões,
pelo Paraná, com R$ 217 bilhões, e pelo Distrito Federal, de R$ 150
bilhões.
Da mesma forma que se critica a alta carga tributária,
veementemente se condena a sonegação, que vem através do “jeitinho”, uma
maneira suave para se praticar deslizes éticos e morais, mas que servem
como o início da escalada para a sonegação, conforme os dados do
Sinprofaz. Assim, confirmada a teoria, parece mesmo que, no Brasil,
o tributo é norma de rejeição social. Ninguém quer pagar tributo, a
cidadania que leva a pagar o tributo é uma cidadania geralmente muito
vulnerável. E em um país onde se tem um déficit de cultura democrática,
um déficit de cidadania, então existe um espaço formidável para essas
coisas. Por isso, há que se ver com distanciamento brechtniano o
discurso de que isso é algo localizado em um nicho A ou um nicho B. Há
que se enxergar isso como de verdade é, sem disfarces ou ilusões. A
cultura da sonegação está entre muitas pessoas ricas, mas pobres sonegam
e pessoas de classe média também, em todos os quadrantes do Brasil, é
inespecífico no País. É um corte transversal.
Não se trata,
evidentemente, de uma novidade. Há momentos em que ela se torna mais
expressiva, há momentos que ela se torna menos expressiva, com uma
infinidade de razões que vão desde a pujança econômica até a pobreza.
Claro que os que estão em situações de pobreza não têm o que sonegar, e
não se trata de um fenômeno recente. Sonegar o imposto de renda é um
fenômeno tributário. Se é um fenômeno cultural, no momento em que de
fato o Brasil quiser encarar esse fantasma da corrupção, tem que olhar
primeiro no espelho e parar de apenas acusar o vizinho e identificar
exatamente onde estão os problemas.
|
|