Contribuinte vai à Justiça para parar de pagar o Refis
15/10/2010
Quase um ano depois do prazo para adesão ao Refis da Crise, que terminou em 30 de novembro, Receita Federal e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ainda não fizeram a consolidação dos débitos dos 561,9 mil contribuintes que colocaram cerca de R$ 1,3 trilhão no parcelamento. A demora tem trazido problemas para empresas que migraram de outros programas. Algumas foram obrigadas a recorrer ao Judiciário ou à via administrativa para suspender o pagamento das parcelas mensais, sem que sejam excluídas do programa. Alegam nos processos que já quitaram o que deviam ao Fisco.
Um contribuinte obteve na Justiça Federal de Campinas (SP) liminar para suspender o pagamento de parcelas de R$ 100 mil a uma indústria. A companhia migrou de um parcelamento ordinário para o Refis da Crise e, como determina a Lei nº 11.941, de 2009, foi obrigada a pagar 85% do valor médio das últimas parcelas, ao contrário das que entraram diretamente no programa e desembolsam apenas R$ 100 por mês até a consolidação dos débitos. A empresa alega já ter quitado todo o montante devido, utilizando o prejuízo fiscal para a liquidação dos valores correspondentes a multas e juros.
Uma outra companhia deve buscar a via administrativa e entrará em breve com um pedido na Receita Federal do Rio Grande do Sul para suspender os pagamentos. A empresa desembolsa cerca de R$ 85 mil por mês e, segundo suas contas, já ultrapassou em cerca de R$ 800 mil a sua dívida. Sem a esperada consolidação, uma outra empresa enfrentou dificuldades para renovar a certidão negativa de débitos (CND), necessária para participar de licitações. Como há divergências entre os valores estimados pela Receita e pela empresa no abatimento de prejuízo fiscal no Refis, o órgão tinha impedido a companhia de renovar a documentação, o que foi liberado por liminar concedida pela Justiça Federal de São Paulo.
A lentidão na consolidação também fez com que o Ministério Público Federal no Distrito Federal instaurasse inquérito civil público para apurar supostas irregularidades no processo. Na liminar concedida ao contribuinte paulista, o juiz substituto Jacimon Santos da Silva, da 6ª Vara Federal de Campinas, autorizou que ele cesse os pagamentos até a consolidação ou até que o Fisco apresente documentação que comprove o quanto é devido. De acordo com a decisão, se a empresa "afirma que pelos seus cálculos já pagou mais do que o valor que resultará da consolidação futura feita pelo Fisco e, de outro lado, a Receita não apresenta o valor consolidado dos créditos, não há razão para que continue pagando".
A advogada que assessora a empresa, Thatiane Nemeth, do Martinelli Advocacia Empresarial, afirma que "a companhia não pode ficar a mercê do Fisco se a consolidação ainda não tem data para ocorrer". Para ela, o pagamento de mais parcelas prejudicaria a empresa que depois teria que entrar com um novo pedido na Receita para reaver os valores recolhidos a maior. "Esses processos demoram no mínimo quatro anos, o que traria ainda mais transtornos", diz. Segundo ela, a decisão abre um importante precedente para as demais companhias na mesma situação. Sem a consolidação das dívidas, o advogado Gláucio Pellegrino Grottoli, do Peixoto e Cury Advogados, afirma que tem dedicado cerca de 40% do seu tempo de trabalho apenas para esclarecer dúvidas de empresas que aderiram ao Refis. Entre os casos, já prepara uma petição administrativa direcionada à Receita Federal do Rio Grande do Sul para uma empresa que entende estar pagando parcelas muito mais altas do que deveria.
Ela paga R$ 85 mil e pelos seus cálculos deveria dispender apenas R$ 35 mil. "Vamos pedir para agilizar a consolidação da dívida ou a suspensão das parcelas", afirma. Se a empresa então não tiver seu problema resolvido, Grottoli também não descarta a hipótese de levar o caso à Justiça. A advogada Valdirene Franhani Lopes, do escritório Braga & Marafon Advogados, representante do contribuinte que buscava a CND, afirma que deve ter de solucionar em breve o caso de duas empresas prestes a pagar todo o valor parcelado. Ela também acredita que a melhor estratégia é tentar primeiramente resolver o problema na Receita, e só depois recorrer à Justiça. Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Receita Federal não quis comentar o assunto. A PGFN não retornou até o fechamento da edição.
(Fonte: Valor Econômico)
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