A
governadora Yeda Crusius se viu livre ontem do fantasma de sofrer
impeachment. Em uma sessão tensa, com incidentes e muitas movimentações
de bastidores, a Assembleia decidiu, por 30 votos a 17, encerrar o
assunto e barrar o afastamento de Yeda.
Atarde que deveria ser
lembrada pelo impeachment que não vingou teve no arremesso de um tomate
e em uma cabeçada os ingredientes do seu prato feito. Enquanto os
deputados da base governista contabilizavam votos, preocupavam-se em
manter quórum e contemplavam a passagem do tempo na sessão que enterrou
a possibilidade de afastar a governadora Yeda Crusius, os corredores,
gabinetes, plateia e até o banheiro do Legislativo gaúcho fervilhavam.
Eram
15h, e a tarde que viria a ser agitada estava morna no plenário. Nove
sonolentos deputados assistiam ao Grande Expediente. Do banheiro logo
abaixo da plateia, veio um grito. Poucos ouviram. O estudante petista
Henrique Portoluza, o Pulga, 25 anos, saiu para a rua, rampa acima,
escoltado por três seguranças. Ele se queixava de ter levado uma
cabeçada no nariz ao sair do banheiro. Seus adversários o acusaram de
gritar “cocoricó” para a deputada Zilá Breitenbach (PSDB). O fato é que
Pulga, 25 minutos após depor no setor de segurança, se recompôs e
passou a tarde aplaudindo seus deputados, entre os 80 companheiros que
se posicionavam à direita, de frente aos 80 governistas, à esquerda.
No
saguão, um grupo de 26 alunos da Escola Anita Garibaldi, de Cruzeiro do
Sul, passava, da porta dos fundos para a da frente. As três professoras
que os acompanhavam aceleravam a marcha na medida em que se davam conta
do clima pesado.
– Vamos visitar o Solar dos Câmara – dizia uma delas, assustada.
Na
entrada do plenário, uma guerra de pareceres: assessores da oposição
sustentavam serem necessários dois terços de votos. Governistas olhavam
com desdém. Era, mesmo, um terço.
Ao lado, um outro grupo, com
assessores do PT, do PDT e do PP esboçavam um banco de apostas. Uns
diziam que a sessão duraria até as 18h30min. Outros, até as 20h. Um
terceiro, com cara de cansado, garantia que as discussões só se
encerrariam às 21h. Enfim, estava certo quem apostou nas 18h30min. O
grupo heterogêneo também passava o tempo prevendo quanto tempo falaria
o deputado Raul Carrión (PC do B), “nosso Fidel”, segundo um deles.
Todos cravaram: ele falaria durante uma interminável hora. Erraram.
Falou durante 40 minutos.
A
sessão não avançou noite adentro por uma questão de estratégia
governista. O combinado era que os deputados da situação evitariam os
discursos. Os oposicionistas falariam tudo o que tinham para dizer,
começaria a votação e o impeachment estaria encerrado.
Os
deputados da oposição imploravam para o processo ir adiante, alegavam
que a comissão especial não realizou sequer uma reunião, que não houve
investigação para se chegar a um resultado. Eram interrompidos por
vaias vindas da direita e aplausos vindos do lado esquerdo.
– Vocês são corruptos! Vocês são
corruptos! – gritou Raul Pont (PT),
olhando para a esquerda, ao encerrar seu discurso.
Carrion, de repente, atravessou o plenário e foi até a claque situacionista.
– Vocês me vaiaram muito? – indagou.
A resposta foi uma risada irônica de quem sabia estar perto do triunfo.
Do
outro lado, nervosismo. O estudante Márcio Duarte apelou: jogou um
tomate, cujo alvo seria o deputado Coffy Rodrigues (PSDB). Errou o alvo
e foi carregado da plateia.
Aí, foi a vez de a deputada Stela
Farias (PT) subir ao púlpito, esbravejar e, ao descer, escancarar duas
páginas de reportagem da revista Isto é, negativa a Yeda.
Os
deputados situacionistas se aprumaram e fizeram uma correria para estar
no plenário quando a oposição pediu verificação de quórum, às 17h. Como
vários fumavam, tomavam café ou conversavam no saguão, voltaram
esbaforidos para evitar a surpresa de ver a sessão encerrada por um
erro tão básico. O deputado Nelson Marchezan Jr. (PSDB) desceu da
plateia, onde conversava com aliados, quase tropeçou nas escadas, mas
garantiu presença. Aliviado, foi à sala onde colegas projetavam o
resultado que estava por vir. Saiu de lá escandalizado:
– Pô, tem um baita cartaz que diz que é proibido fumar. E é proibido fumar em locais fechados.
O
fumo, o cafezinho e a conversa no saguão eram formas de afastar a
tensão. Até que ela se esvaiu, com a vitória garantida e a salva de
três foguetes do lado de fora.
leo.gerchmann@zerohora.com.br
LÉO GERCHMANN