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Ana Pellini aposta na eficiência da gestão pública

28/09/2009

Sem vinculação partidária, Ana ocupou cargos estratégicos em diferentes governos. Cláudio Fachel/JC

Sem vinculação partidária, Ana ocupou cargos estratégicos em diferentes governos. Foto: Cláudio Fachel/JC

A secretária-geral de Governo, Ana Pellini, que assumiu a pasta no início de setembro no lugar de Erik Camarano, traz na sua trajetória profissional ampla experiência na área de gestão. Servidora concursada do Estado, ela defende a eficiência na administração pública e garante que a capacidade de gerir com competência não é exclusividade da iniciativa privada. “A gestão pública pode achar o caminho e fazer com que as coisas atinjam da melhor maneira a população”, afirma. Ana Pellini pretende se valer da experiência acumulada no setor para diminuir os entraves burocráticos e agilizar os programas estruturantes, um dos carros-chefe do governo Yeda Crusius (PSDB). O andamento dos programas sofreu alguns atrasos ao longo de 2009 em função de questões burocráticas já solucionadas. Por isso, a expectativa da secretária é de que até março de 2010 seja possível recuperar o tempo perdido neste ano. Ana Pellini destaca ainda que o orçamento estadual para 2010, em tramitação na Assembleia Legislativa, é uma peça realista, produto do empenho do governo em zerar o déficit. “Uma grande conquista foi o orçamento realista. Sou do tempo em que o orçamento era uma peça formal de ficção”, lembra.

Perfil

Natural de Caxias do Sul, Ana Maria Pellini veio para a Capital em 1973, para estudar. É contadora formada pela Ufrgs, com mestrado em Administração. Funcionária de carreira, ingressou na Secretaria Estadual da Fazenda com 18 anos e alcançou o cargo de auditora fiscal do Tesouro.

Sem vinculação partidária, teve trânsito fácil em diferentes governos, ocupando cargos estratégicos. No governo Antônio Britto (1995-1998), trabalhou junto ao gabinete do secretário da Fazenda, Cézar Busatto. A experiência ofereceu visão sobre o funcionamento da estrutura do Estado. Também assessorou Busatto, por dois anos, quando ele exerceu mandato na Assembleia Legislativa.

Outra atuação importante foi no cargo de diretora-geral do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). Ana Pellini considera marcante o trabalho realizado como diretora-geral da Secretaria da Segurança Pública, durante o governo Germano Rigotto (2003-2006), do qual destaca a necessidade de o gestor ter agilidade para enfrentar os problemas. Desde maio de 2007, estava à frente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) e, no início deste mês, a convite da governadora Yeda Crusius, assumiu como secretária-geral de Governo.


Jornal do Comércio - À frente da Secretaria-Geral de Governo, quais são os seus desafios?

Ana Pellini - Vou procurar destravar algumas coisas. A burocracia no setor público é uma coisa desesperadora. E não estou falando só do nosso Estado. É uma luta do setor público em todas as esferas de governo e em todos os órgãos. E é isso que vou ter de procurar administrar de forma que a gente consiga vencer essa burocracia sem descumprir nenhum aspecto de legalidade.

JC - A gestão pública, tão criticada em relação à iniciativa privada, pode apresentar soluções eficientes?

Ana Pellini - Sim. Temos essas ferramentas, essa visão. No setor privado, eles são obrigados de uma maneira muito intensa a buscar essas soluções, porque eles dependem disso, sob pena de desaparecerem. O setor público fica mais acomodado porque não tem essa pressão. Mas há muitos bons gestores no setor público que acham a solução, sim. Tenho me empenhado a vida toda e acredito, sim, que a gestão pública pode achar o caminho e pode fazer com que as coisas atinjam da melhor maneira a população, que é o objetivo. O serviço público não existe para si próprio. Ele existe porque tem um cidadão que precisa da gente.

JC - O governo tem se caracterizado por mudanças no secretariado. A própria governadora chamou de ‘dança das cadeiras’ em determinada ocasião. Isso prejudica a governabilidade?

Ana Pellini - Não. Considero muito o princípio da impessoalidade. As coisas têm que ser formatadas de modo que elas funcionem independente de A, B ou C. Elas têm que funcionar porque estão organizadas para funcionar desse jeito. E a governadora chegou com muita força porque ela tinha um projeto bem estruturado. E ela sabia como fazer, porque é do ramo, é economista. Sabia que queria o déficit zero e sabia como chegar até ele. Ela trouxe a sistemática das câmaras setoriais, por exemplo, em que os secretários cuidam de vários assuntos. E, portanto, temos que ser solidários uns com os outros. Temos que dividir as informações. Cheguei na Secretaria-geral de Governo e encontrei uma estrutura que funciona assim. Erik (Camarano) já deixou dessa maneira. Se a Ana sair, vem outro. Mas há uma estrutura que funciona, um método. Isso é uma riqueza que o Estado não pode perder.

JC - O orçamento estadual para 2010 já está na Assembleia, estimado em R$ 27,7bilhões. Houve redução na meta de investimentos. A expectativa era chegar aos 10%, mas, diante da crise econômica mundial, acabou fixada em 8%. Haverá impacto nos programas estruturantes?

Ana Pellini - Uma grande conquista obtida foi o orçamento realista. Sou do tempo em que o orçamento era uma peça formal de ficção. Ia para a Assembleia Legislativa, lá os deputados discutiam. Já ia deficitário para lá. Chamávamos de receitas extraordinárias, não especificadas de onde vinham. Na execução é que se dava o verdadeiro orçamento, aquilo era só para constar. A governadora é do ramo, isso ajudou muito a compreensão dela de que é preciso equilibrar as contas e ter um orçamento de verdade. Aquilo é uma bíblia e tem que ser cumprido. Então, tem que ser realista. Se são 8% que cabem no nosso recurso, serão 8% que vamos fazer. Aquilo tudo que está lá tem que expressar o que vai acontecer no ano seguinte. Estamos trabalhando com esse viés. A crise realmente veio, veio para todo mundo. O Brasil sentiu menos, porque estava preparado, e o Rio Grande do Sul, dentro do Brasil, menos ainda, porque o ICMS sofreu queda, mas não tanto como em outros estados. O que mais está nos prejudicando são as transferências da União, que diminuíram muito em razão, inclusive, de estímulos fiscais que o governo federal deu para aquecer a economia. Reduziu a receita, então vamos nos adequar. O patrimônio de ter contas equilibradas e um orçamento realista não se pode abrir mão nunca. Para o governo é algo sagrado. Todo mundo tem que lutar por isso, porque aí a gente olha a peça orçamentária e vê exatamente o que vai acontecer no próximo ano. Se tiver que dar uma reduzida em algum projeto estruturante, se reduz um pouco o ritmo e se faz a adequação aos recursos que temos.

JC - O período de retração da economia coincidiu com alguns entraves burocráticos que atrasaram os programas estruturantes. A expectativa é de recuperação?

Ana Pellini - Estamos nos organizando. O nosso planejamento não está sendo feito até o fim do ano, mas até março de 2010. O Estado passou muita dificuldade financeira nos últimos anos e acabou se desestruturando. Então as carências de pessoas nas áreas estratégicas eram muito grandes. A Secretaria de Obras tinha menos engenheiros que o Tribunal de Contas do Estado. O órgão que fiscaliza o nosso trabalho tem mais engenheiros para fiscalizar do que nós para fazê-lo. Então, fazer concurso ou contratar emergencialmente profissionais demora um tempo. Nossa expectativa é de que, até março, se consiga recuperar o tempo perdido neste ano. Estamos nos esforçando. Muitas daquelas dificuldades estão em vias de superação total.

JC - Tem sido recorrente o não cumprimento pelos governos dos mínimos constitucionais para as áreas da Saúde e Educação. É possível modificar essa dinâmica?

Ana Pellini - Isso de dividir o orçamento por percentuais é algo ultrapassado. Teve a sua função, mas agora é totalmente ultrapassado. O que temos que ver é que estamos aplicando em saúde como nunca no Estado. A segunda pergunta que deve ser feita em tempos modernos é se estamos aplicando bem. Temos no Estado a maior expectativa de vida do País. Estamos entre as menores mortalidades infantis do mundo. Temos outros indicadores de saúde, muito importantes, que estamos atingindo. Isso é que é importante. Há regiões que precisam mais. Há regiões que têm mais condições e precisam menos. E sobre isso não se tinha informação para avaliar. Este ano conseguimos obter esses dados. Não quer dizer que já se tenha atingido a distribuição de recursos regionais ideal. Mas, pelo menos, enxergamos e podemos planejar e discutir o futuro como se deseja fazer. Inclusive, considerando a idade da população e uma série de elementos de que até então não se dispunha, porque não tínhamos todas as informações para fazer esse planejamento. Isso é um ganho para o Estado muito mais importante do que um percentual. O que um percentual diz? Posso gastar mal. Aí, também não atingiu o objetivo público, que é o essencial, de melhorar a saúde da população.

JC - Os debates na CPI da Corrupção, instalada na Assembleia Legislativa, têm prejudicado o funcionamento do governo?

Ana Pellini - Sou técnica. Não me envolvo muito nessas questões. Mas, como cidadã, acho que prejudica muito o Estado. Essa campanha que estão fazendo, sempre com as mesmas acusações, acaba prejudicando a imagem dos gaúchos. Isso prejudica o andamento, de certa forma, do governo. A gente se esforça muito para que o mínimo prejuízo ocorra. É muito ruim o que estão fazendo, tanto a CPI, como o processo de impeachment (que tramita no Legislativo contra a governadora Yeda Crusius), que é jogo de cena, já antecipando o processo eleitoral. Isso é uma irresponsabilidade das pessoas que só pensam no seu umbigo, na sua candidatura e não veem que o Estado precisa de uma imagem sólida. O Rio Grande do Sul sempre contou com uma imagem de respeitabilidade. Temos orgulho disso.

JC - A governadora tem afirmado que, no ano que vem, vai fazer o debate sobre o projeto de governo com os gaúchos. Isso significa que pretende se candidatar à reeleição?

Ana Pellini - Independentemente disso, ela é uma mulher de planejamento. Então, essa discussão só pode vir em benefício do Estado. Um projeto com essas características se torna um projeto do Estado. Seria natural a governadora apresentar uma candidatura para se reeleger.

JC - O governo é criticado por estar falhando na articulção política. A ida de Otomar Vivian (PP) para a Casa Civil qualifica esse processo?

Ana Pellini - No começo tudo era muito difícil. A meta do déficit zero foi difícil de ser atendida. A governadora teve que usar a força dela para que o déficit zero realmente acontecesse. Ela fazia reuniões exaustivas com seus secretários e acompanhava cada tostão que entrava e saia. Houve um grande esforço pessoal dela nessa conquista. Então, talvez, ela não tenha tido tempo para se dedicar a essa relação política como precisaria. Agora que as coisas estão mais tranquilas, o governo funcionando e o projeto bem consolidado, é possível que ela possa ter mais tempo para isso. O secretário Otomar Vivian, agora na Casa Civil, tem muita habilidade para isso também, assim como (José Alberto) Wenzel teve seu papel, passou por crises duríssimas. Se espera que agora o governo consiga ter energia e condições de dialogar de uma maneira mais tranquila com a sociedade, uma vez que internamente as coisas estão bem mais consolidadas.

JC - Antes de entrar para a Fepam, a senhora tinha algum vínculo com a área ambiental?

Ana Pellini - Não tinha nenhum vínculo com a área ambiental. Naquele tempo, a Fepam estava passando por uma crise institucional muito forte em decorrência da discussão da atividade da silvicultura no Estado. Foi uma comoção. A Assembleia tinha uma frente parlamentar a favor da silvicultura. O Ministério Público Estadual (MPE) era contra, tinha um grupo de promotores contra. O Judiciário tinha várias ações também que tramitavam lá. E as empresas queriam fazer investimentos grandes. Afora isso, a Fepam estava com um acúmulo de processos muito grande. Havia mais de 12 mil pedidos de licenciamento sem andamento na época. Era um desafio grande porque não adiantava só bem operar. Eles tinham que ter conteúdo porque o pior é dar uma licença ambiental a um empresário e depois a Justiça caçar, quando ele já começou o investimento. É horrível.

JC - A questão do meio ambiente está sendo bem conduzida?

Ana Pellini - O enfoque que está sendo dado é o ambiental. Procuramos eliminar a burocracia. Havia muitos casos em que um documento era protocolado e demorava meses para chegar no processo, porque não havia um trâmite, colocavam em uma caixa e ficava parado por um ano. Então o que retardava não era o cuidado com o meio ambiente, era a burocracia, a ineficiência no tratamento processual.

JC - Na campanha presidencial de 2010, a agenda verde vai entrar na pauta, muito por conta da candidatura da ex-ministra Marina Silva, agora no PV.

Ana Pellini - O tema ambiental é a questão do momento e do futuro. Não temos como desconhecer que o planeta está mudando e vamos ter que mudar nossa conduta. Não quero dar um discurso de ambientalista, mas não temos, por exemplo, preocupação com lixo e resíduos. Cada um vai ter que mudar o seu perfil. Em todo o mundo há essa preocupação. Que bom que Marina Silva vai concorrer e debater isso. Mas essa pauta virá independentemente disso.

JC - Como está a tramitação do processo a que a senhora responde, envolvendo a questão da silvicultura?

Ana Pellini - No começo, estava tudo muito tumultuado, mas se pacificou a questão da silvicultura. Os técnicos da Fepam estavam muito inseguros, porque quando não há uma diretriz clara e uma segurança jurídica, só se atemoriza. E essa segurança veio com o secretário (Carlos) Otaviano (Brenner de Moraes). Ele chamava os técnicos, explicava, e isso começou a criar uma confiança. A mesma coisa não foi feita com as ONGs. Tanto que o estranho disso tudo é que esse processo de assédio moral aos funcionários da Fepam não é movido por um funcionário assediado. É movido por uma ONG que diz que eu assediei os funcionários da Fepam. Não veio de dentro, veio das ONGs.

JC - O processo foi motivado pela exigência de prazo para a liberação das licenças?

Ana Pellini - Quando a força tarefa foi estabelecida, as pessoas tinham quota e tempo para fazer as coisas. Ainda não me ensinaram um jeito de dar conta de 12 mil processos a não ser dizendo que há uma carga de processos e perguntando quanto tempo é necessário para resolver. Hoje tenho orgulho de dizer que cumprimos os prazos legais: seis meses para dar resposta a um empreendedor de um licenciamento ordinário e um ano para os complexos, com estudo de impacto ambiental. Algo que me deixa tranquila é que na minha despedida da Fepam não houve nenhum movimento. Ninguém esteve lá para me dizer “graças a Deus”. Entre os funcionários, isso passou. Só que o processo anda. O juiz negou a liminar para me retirar do cargo, na época. Não sei o que vai dar. Tenho a esperança de que isso se resolva naturalmente.



(Fonte: Jornal do Comércio)

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