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Receita de crise

26/08/2009

O que está ocorrendo na Receita Federal é reflexo da mentalidade intervencionista e dirigista do governo. Infelizmente, o aparelhamento político do Estado vem se agravando na atual administração, com ameaças frequentes para a autonomia de órgãos públicos e para a própria democracia. O episódio em que 12 altos funcionários da Receita Federal – seis superintendentes estaduais, cinco coordenadores e um subsecretário da instituição – puseram seus cargos à disposição reflete uma espécie de rebelião contra as ingerências de caráter político numa área que deveria ser conduzida com critérios exclusivamente técnicos.

Os servidores públicos da estrutura tributária estão entre os considerados como integrantes das carreiras de Estado. Têm a mesma importância para o país que o serviço diplomático ou a Polícia Federal, por exemplo. Eles trabalham numa das áreas vitais para o próprio funcionamento do país, gerenciando o sistema de impostos e taxas que a população paga para manter as instituições e para garantir os serviços essenciais. Por isso e pela relevância das funções que exercem, tais servidores não podem ficar sujeitos nem às conveniências dos partidos ou frentes partidárias que se sucedem no poder, nem aos interesses políticos ou eleitorais de um ministro ou de um presidente. A apropriação das instituições e de suas funções relevantes pelos partidos é o retrato da falta de maturidade da democracia. Há anos, o país assiste, não sem constrangimento, à distribuição de cargos a pessoas cuja qualificação para as funções não passa de uma ficha partidária ou do apadrinhamento de um chefe político. Assim, o Banco do Brasil, a Petrobras e outras empresas ou agências acabam conduzidas com objetivos partidários ou eleitorais, numa apropriação indevida de empresas e serviços que são permanentes. Até a Polícia Federal e agora a Receita, instituições fundamentais para a estrutura do Estado brasileiro, são alvo da cobiça dos que julgam que a vitória eleitoral significa licença para usar o poder para qualquer objetivo, especialmente os que não se confundem com o interesse público e às vezes a ele se opõem.

Há um inequívoco alerta na rebelião dos superintendentes e coordenadores de área da Receita Federal. O Brasil precisa avançar na busca de um serviço público profissionalizado, de uma burocracia competente e com autonomia técnica e de uma democracia em que os partidos cheguem ao poder para servir ao país e não para administrar a coisa pública como se ela fosse moldável partidariamente. As carreiras de Estado precisam ser preservadas porque, se não forem tecnicamente qualificadas e autônomas e se não agirem dentro dos princípios de impessoalidade, moralidade, eficiência e legalidade (como exige o artigo 37 da Constituição), não cumprirão seu papel de indispensável esteio do Estado democrático de direito.


(Fonte: EDITORIAL ZERO HORA)

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