Uma gestão com dia e hora para terminar
08/01/2009
 No
início de dezembro, o secretário da Fazenda, Aod Cunha, pediu uma
audiência à governadora Yeda Crusius e anunciou que tinha amadurecido a
decisão de deixar o governo.
A intenção já rondava sua cabeça
desde setembro, quando as previsões da Fazenda demonstravam que seria
possível alcançar o equilíbrio das contas públicas até o final do ano.
Ao
aceitar o convite da governadora para comandar o ajuste fiscal, no
final de 2006, Aod havia acordado que sua permanência no cargo estava
ligada à conquista do déficit zero. O secretário não queria perder de
vista outros projetos, como a bolsa de pós-doutorado de um ano na
Universidade Harvard, nos Estados Unidos, relegada após o ingresso no
Executivo.
No encontro com Yeda, o secretário justificou que
considerava vencida a etapa mais importante da sua missão no governo,
desejava outros desafios e estava em busca de um mínimo de qualidade de
vida. O economista estava cansado e sentindo-se culpado em relação às
cobranças da família. O economista sente falta de um avô morador de
Imbituba, em Santa Catarina, com quem costumava passar as férias de
verão quando criança.
Yeda,
em princípio, teria relutado, argumentando que não fazia sentido deixar
o cargo agora que começaria a colheita depois de dois anos de
sacrifícios. Em seguida, disse que respeitaria a decisão do seu
ex-aluno, coordenador do plano de governo e um dos primeiros a
acreditar que ela tinha alguma chance na eleição de 2006.
– Isso
era algo discutido há muito tempo entre os dois. Yeda entendeu o bom
momento de Aod e respeitou o valor que ele conquistou – diz um amigo de
Aod.
Naquele dia, Yeda fez dois pedidos a Aod: que ficasse até o
final do ano, porque ela pretendia tirar uma folga para receber o filho
que mora nos Estados Unidos e não queria tumultuar o período de
descanso, e que não contasse para ninguém. Aod guardou o segredo até o
Natal, quando pediu autorização para contar a notícia a seu interino,
Ricardo Englert, e ao secretário do Planejamento, Mateus Bandeira.
Depois, falou com os amigos, como Fernando Schüler, secretário da
Justiça. Os dois almoçaram juntos na terça-feira. Aod falou de seus
planos com entusiasmo.
–
Aod deixa um exemplo de como se pode dignificar a função pública. Ele
provou que um desafio histórico, o déficit do Estado, poderia ser
enfrentado – diz Schüler.
A saída só deveria ser anunciada na
próxima segunda-feira, mas foi precipitada por dois fatos: a
preocupação com o risco de vazamento da informação, que na terça-feira
era conhecida de parte dos secretários, e a disposição da titular da
Educação, Mariza Abreu, de deixar o governo. Mariza chegou a sugerir
que os dois anunciassem a saída juntos, mas Aod não concordou. Ponderou
que as situações eram diferentes e que ela deveria continuar no cargo e
lutar pela aprovação das mudanças na educação, que vinha defendendo com
unhas e dentes.
Aos interlocutores mais próximos, Aod não
escondia sua falta de gosto pela política. Assessores dizem que, apesar
da diplomacia, ele não é afeito à formalidade do cargo. Servidores da
Fazenda se acostumaram a se dirigir ao chefe usando o primeiro nome e
não o tradicional “senhor”.
No
final de 2007, Aod chamou seus principais assessores para uma reunião
logo após a derrubada do pacote de aumento de ICMS. Apesar de ter
pensando em desistir da função, a intenção do secretário era desmentir
especulações e confirmar que permaneceria no cargo mesmo diante da
derrota na Assembleia. Naquele dia, porém, sinalizou que seu projeto de
vida teria outros rumos em pouco tempo.
Como repercutiu a saída de Aod | YEDA CRUSIUS, GOVERNADORA | “Insubstituível
é só na propaganda do Daer, quando a gente não pode substituir a pessoa
que se foi por uma questão de acidente de trânsito. Essa pessoa é
insubstituível. Eu não sou, Aod não é. O jogo público não depende da
pessoa. O público depende da direção, do rumo, do projeto.” | No Executivo | Paulo Afonso Feijó | vice-governador | “Não
via razões da saída. Lastimo que um técnico e um profissional como o
Aod deixe de fazer parte do governo. Houve discórdias, mas sempre tive
muito respeito pelo Aod.” | No Judiciário | Voltaire de Lima Moraes | presidente do
Conselho de Relações Institucionais do Tribunal de Justiça | “Aod
é um secretário que tinha credibilidade no Poder Judiciário e
respeitabilidade. Conseguia com raro talento reunir dois predicados. De
um lado, a alta capacidade de domínio da área que chefiava e, de outro,
uma capacidade de interlocução acentuada com os demais poderes.” | No Ministério Público | Eduardo de Lima Veiga | procurador-geral de Justiça em exercício | “Aod
demonstrou que uma gestão profissional faz a diferença. Temos a
confiança que a governadora, líder desse processo, manterá as boas
práticas de seu governo.” | No Legislativo | Alceu Moreira (PMDB) | presidente da Assembleia Legislativa | “A
governadora tem de buscar na substituição alguém que tenha um perfil
capaz de dar cumprimento às políticas já implantadas e que tenha
autoridade política para implantá-las.” | Entre a oposição | Raul Pont (PT) | deputado e líder da bancada | “Foi
uma gestão neoliberal, preocupada exclusivamente com essa busca
obsessiva de déficit zero. Para isso, manipulou orçamento, deixou de
cumprir o que o Estado tem de fazer, que é prestar serviço público.” | Adroaldo Loureiro (PDT) | deputado e líder da bancada | “É
uma das tantas mudanças no governo. O Aod era um secretário
qualificado, sem dúvida nenhuma. Acredito que a saída dele não muda o
projeto no governo. Para o PDT, não representa mudança nenhuma, nem
para a sociedade.” | Entre os aliados | Pedro Simon (PMDB) | senador | “O
Aod saiu do governo? Estou aqui sentado. Se não estivesse sentado, eu
caía. Uma surpresa que eu nunca imaginava. É uma figura raríssima
porque tem capacidade como técnico espetacular, como economista e como
político. Foi uma decisão infeliz da governadora em aceitar a demissão.” | Entre os empresários | Paulo Tigre | presidente da Fiergs | “Foi
uma decisão que surpreendeu a todos. O problema estrutural do Estado
não terminou. Aod é um interlocutor sério, honesto, aberto, tanto
defendendo seus pontos de vista quanto aceitando os dos outros. Sua
saída do governo é uma perda e um marco.” |
(Fonte: Zero Hora)
|
|