O governo Yeda e “A Montanha Mágica”, por Adão Villaverde*
23/12/2008
Thomas Mann, o grande romancista e humanista alemão, escreveu nos anos que sucederam à I Guerra Mundial uma de suas maiores obras: A Montanha Mágica. Nela, mostra uma Europa dilacerada, desprovida de unidade e distante da possibilidade de construir um projeto social para seu povo. O cenário da narrativa é o alto de uma montanha, num sanatório de uma aldeia suíça em Davos, onde, aproximados por suas enfermidades, tipos de todos os credos e raças expõem seus problemas, conflitos, sofrimentos e ilusões, revelando que, mesmo isolados do mundo da planície, continuam a sofrer forte influência do universo lá fora.
É nesse ambiente que surge Hans Castorp, um jovem de origem burguesa que, ao visitar o primo, descobre que também está doente e opta por passar uns dias ali. Na evolução do tratamento, se questiona profundamente diante da vida, ressignificando-a e dando um sentido que a explique e a justifique. Talvez esta grande e extraordinária obra do gênero humano possa servir como metáfora para questões da gestão pública aqui, na planície pampiana. Por mais generosos que possamos ser, o governo gaúcho ingressa na sua metade final com marcas indeléveis: seu caráter é essencialmente conflitivo, seu método desconhece o verbo negociar, seu padrão de gestão é o do desmonte das funções públicas de Estado e de convivência com desvios éticos, sua relação com os movimentos sociais é depositária de forte componente repressivo e, mesmo diante da esmagadora maioria que possui na Assembléia, foi derrotado em todas as votações centrais deste primeiro período de governo.
Será que a jornada do herói Hans Castorp não poderia servir de luz ao Executivo para adotar, de forma propositiva, uma postura mais instigante e de se interrogar acerca do seu padrão de gestão?
Talvez esta atitude lhe permitisse concluir que, no ato de governar, nada existe em si e para si. Mas que a cada gesto público está conjugado um conjunto de ações e reações, as conhecidas pressões e contrapressões, cujas determinações são resultantes da dinâmica operacional de administrar, imprimida por cada gestor público. De onde decorrem, evidentemente, compromissos e responsabilidades dos representantes para com seus representados. Exigindo também daqueles, antes de mais nada, a necessária e esperada estatura política para descer da montanha e andar pela planície como forma de melhor se vincular ao solo social original que lhe conferiu tal delegação.
*Professor, engenheiro e deputado estadual (PT-RS)
(Fonte: Zero Hora)
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