FSP: Caixa dois gira R$ 1 tri por ano, diz estudo
15/08/2005
PAÍS DO MENSALÃO
Sonegação cresce desde 2001 e já atinge cerca de 30% das empresas, estima instituto de planejamento tributário
A sonegação fiscal e o caixa dois -gêmeos siameses na economia brasileira- cresceram desde 2001. O caixa dois das empresas alcançou a cifra de R$ 1,028 trilhão, em 2004, segundo estimativa feita pelo IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) com base em estudo sobre sonegação fiscal no país. Em 2001, esse valor atingiu a casa dos R$ 587,7 bilhões, estima o instituto.
A prática do faturamento "por fora" -sem nota fiscal, meia nota e outros artifícios- permite que 39,27% da arrecadação anual do país escorra pelo vão dos dedos do leão, segundo os cálculos do IBPT. Como as empresas são responsáveis por 75% da arrecadação tributária, isso significa que R$ 191,74 bilhões em impostos deixaram de ser pagos em 2004.
Em 2001, a evasão foi de R$ 144,6 bilhões, diz o instituto. "Não há sonegação sem caixa dois, ele é feito justamente para fugir da tributação", diz Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT.
Ele explica que o volume de recursos movimentado por caixa dois no país é uma estimativa. O número a que chegou o instituto baseia-se na metodologia usada no estudo feito sobre sonegação em 2002, com base em dados de 2001 e atualizado anualmente.
Nesse estudo, o instituto cruzou os dados de faturamento, movimentação financeira e impostos pagos obtidos em balanços de 7.437 empresas de todos os setores da economia e de portes diferenciados. A conclusão é que, no ano passado, 29,45% das empresas brasileiras praticaram algum tipo de sonegação. Em 2001, esse índice era de 27,53%.
Carnaval, futebol e caixa dois
Para o advogado Otto Steiner, ex-diretor jurídico da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), "o Brasil é o país do Carnaval, do futebol e do caixa dois". Segundo o advogado, não é só para fugir do pagamento de impostos que as empresas fazem caixa dois. "Esse dinheiro não-contabilizado alimenta a corrupção: é usado para pagar propinas a políticos, "caixinhas" a funcionários públicos e para obter vantagens em operações comerciais."
Ele considera a corrupção um "problema endêmico no país, pois a estrutura do Estado permite isso". Exemplo claro dessa permissividade é que, ao mesmo tempo em que faz leis para punir o sonegador, o Estado cria mecanismos de fuga da punição.
O roteiro da impunidade é bem conhecido: "A empresa sonega, é autuada, o Ministério Público faz a denúncia e, aí, o sonegador fecha um acordo para pagar parceladamente o débito. Com isso, o processo é extinto", diz Steiner.
Ou seja, o acordo para pagar o que foi sonegado extingue a punibilidade, e não é aberto processo criminal. "Nos EUA, por exemplo, o pagamento do débito pode reduzir a pena, mas não a extingue", comenta Steiner.
No ano passado, foram emitidos 12.059 autos de infração pela Receita Federal. O valor das multas chegou a R$ 75,1 bilhões. Esse valor corresponde a 23,11% do valor total da arrecadação da Receita. Em 2003, as multas representaram 17,29% da arrecadação total.
Embora o valor dos autos de infração em relação à arrecadação total tenha crescido, o número de empresas fiscalizadas caiu de 17 mil, em 2003, para 12 mil, no ano passado. "O universo de empresas fiscalizadas ainda é muito pequeno, só 0,22% do total foi fiscalizado no ano passado. A estratégia da Receita é se concentrar nas grandes empresas", diz Amaral.
Apesar do cerco, a sonegação cresce. "Hoje, entre 98% e 99% das empresas cadastradas no CNPJ [Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas] estão no Cadin [Cadastro Informativo de Créditos não Quitados]", diz o advogado Jairo Saddi, professor do Ibmec. O Cadin é um tipo de SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) em que são registrados os débitos tributários das empresas.
Líderes
Os índices de sonegação variam de acordo com o setor da economia e o porte da empresa, mostra o estudo do IBPT. "O comércio é o setor campeão em fugir do fisco, mas na indústria está o maior volume sonegado", diz Amaral.
No setor comercial, o estudo identificou indícios de sonegação fiscal em 31,23% das empresas pesquisadas. Em 2002, o índice era de 29,28%. Entre as indústrias, encontraram-se indícios de sonegação em 27,02% das pesquisadas (em 2002, eram 26,31%). No setor de serviços, o índice encontrado foi de 22,45% (em 2002, era de 25,93%). A redução da sonegação no setor de serviços, diz o estudo, deve-se à retenção na fonte de PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), instituída a partir de fevereiro de 2004.
O estudo mostra, também, que os indícios de sonegação aparecem mais entre as empresas pequenas (63,66% do total pesquisado). Nas de porte médio, o índice de sonegação encontrado foi de 48,94%, e nas grandes, de 27,13%.
O IBPT considera indícios de sonegação discrepâncias encontradas no cruzamento do valor do faturamento declarado pela empresa no balanço, com sua movimentação bancária (medida pelo pagamento de CPMF). "Outra forma de verificar se houve sonegação é comparar a receita declarada para fins de cobrança do ICMS com a base de cálculo usada para o pagamento do PIS e da Cofins", explica Amaral.
Fonte: Folha de São Paulo
Data: 14/08/05
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