Paulo Santana: Direitos violados
01/06/2006
Dou barrigada de risos quando ouço falar em respeito aos direitos adquiridos. Dou ainda maiores barrigadas de risos quando ouço falar de ser difícil derrubar direitos adquiridos, como se não tivesse havido recentemente uma reforma da Previdência.
Todos os dias são rasgados direitos adquiridos.
E como os direitos adquiridos em causa, referidos pelo ministro Tarso Genro, pertinem ao funcionalismo público, pergunto: não foram rasgados os direitos adquiridos dos auditores fiscais da Receita Federal, que estão em greve atualmente porque tiveram esses direitos ultrajados?
E não foram violados por acaso os direitos adquiridos dos funcionários do INSS, que estão de greve faz vários anos?
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O que existe no Brasil são direitos adquiridos preservados pelas categorias que dispõem de poder político e direitos adquiridos enxovalhados e jogados no lixo daquelas categorias que não têm poder político.
Bem o fazem as categorias que não permitem que os governos conspurquem seus direitos adquiridos. Infelizmente nada pode fazer, por impotência, a maioria das categorias que passam anos sobre anos sem reajuste dos vencimentos, ingressando na miserabilidade e na condição indigna de marginalizados do bolo do poder.
Mas é desigual.
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Leio que o presidente Lula está baixando medidas provisórias que vão reajustar os vencimentos de 160 mil a 320 mil funcionários públicos federais.
Vibro com isso, os jornais referem que Lula está reajustando os barnabés federais com pressa, em face das eleições. Não importa que seja eleitoreira a medida de Lula, o que importa é que estes reajustes pelo menos amenizam os anos e anos de agruras por que passaram os funcionários públicos federais.
Anos e anos em que foram batidos todos os recordes de arrecadação da Receita Federal e os funcionários públicos federais, inclusive os militares, garroteados pelo desumano arrocho de seus vencimentos. Os auditores fiscais, responsáveis diretos pelos rutilantes aumentos da receita da União, assistiram à sua dignidade profissional desmerecida pelos donos do poder, de tal sorte que muitos deles foram procurar na iniciativa privada uma recompensa justa para sua capacidade técnica, fruto de anos e anos de estudo e aperfeiçoamento.
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Diz a Constituição que os funcionários têm de ser reajustados anualmente, e se intui que o sejam pelo menos com base no índice inflacionário.
Isto é um direito adquirido e constitucional. Foi respeitado? Que nada, foi atacado, vilipendiado, rasgado.
E agora me vêm falar em direito adquirido intocável? Isto é uma balela.
Que o digam os funcionários públicos estaduais, os do Poder Executivo, mais de 10 anos sem reajuste, de vez em quando alcançam a eles migalhas que nem coçam seus bolsos, esmolas, óbolos da indignidade.
Funcionários públicos estaduais da Saúde, da Educação, da Polícia Civil e da Brigada Militar, os técnicos-científicos, de todas as secretarias, todos atirados ao mais profundo abandono salarial, num desrespeito ao direito adquirido que não comoveu ninguém, nem mesmo à Justiça, consagrando-se assim brutalmente um outro precatório.
E os pães, os biscoitos e as massas, filhos legítimos dos trigos, terão agora 20% de aumento. E a gasolina aumentou durante todos esses anos mais de 40% ao ano. E aumentaram os preços de todas as tarifas públicas de forma selvagem durante todos esses anos.
E o funcionalismo público estadual a pão e água, juntando-se inexoravelmente aos marginais e aos famintos.
E vêm me contar esta lorota de direitos adquiridos intocáveis?
Há muito que os direitos adquiridos já foram estuprados.
Zero Hora
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