"Falconi errou por ingenuidade política", diz Busatto
23/06/2006
23/06/2006
Entrevista: Cézar Busatto, coordenador técnico do Pacto pelo Rio Grande
MARCIELE BRUM
Coordenador executivo do projeto Pacto pelo Rio Grande e ex-secretário da Fazenda, o deputado estadual Cézar Busatto (PPS) tenta apagar o incêndio causado pelo consultor Vicente Falconi. Na segunda-feira, convidado pelo Pacto a fazer uma palestra em Porto Alegre, o dirigente do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG) disse em entrevista a Zero Hora que "faltaram fé, dedicação e vontade" ao Estado para aplicar a receita proposta pela consultoria desde o ano passado e superar a penúria financeira. Falconi atribuiu os resultados parciais a uma "liderança fraca".
Busatto diz que as declarações "atrapalharam" o consenso que está sendo construído entre governo e oposição. O Pacto pretende criar uma agenda mínima de medidas a serem implementadas pelo próximo governador.
A seguir, leia a síntese de entrevista concedida na tarde de ontem por Busatto a ZH:
Zero Hora - O senhor concorda com a avaliação do consultor Vicente Falconi?
Cézar Busatto - Eu concordo na parte que trata do papel fundamental da melhoria dos processos, do sistema de gerenciamento, dos indicadores e da introdução da avaliação para medir resultados. Estou de acordo integralmente com essa dimensão do planejamento estratégico e com a aplicação concreta dele no poder público. Estamos aplicando isso na prefeitura de Porto Alegre e temos excelentes resultados. Em que eu discordo de Falconi? Os problemas do Rio Grande do Sul são diferentes dos de Porto Alegre e de Minas Gerais. Há uma cultura. Faz mais de 30 anos que o Estado gasta mais do que arrecada. Falconi passou uma idéia equivocada de que o problema é exclusivamente de gerenciamento. Não é só isso. Temos de enfrentar questões estruturais. Sem uma pactuação política entre governo e oposição, não poderemos fazer essas mudanças.
ZH - O Estado fez apenas a metade da lição de casa proposta pela consultoria?
Busatto - Não opero no governo e meu partido não participa dele. Não tenho condições de julgar porque não conheço a dimensão gerencial proposta por Falconi. A dimensão do gerenciamento é interna à máquina política. A dimensão da crise estrutural é externa. Muitas vezes o governo quer fazer algo, mas a oposição ou sua própria base de sustentação não deixa tomar medidas duras e difíceis.
ZH - Com maioria na Assembléia Legislativa, por que o governo não tenta costurar as mudanças necessárias?
Busatto - Poderia ter feito isso. Cada governo tentou enfrentar os problemas da sua maneira. Outros governos tiveram maioria política e tentaram. Mas não foi suficiente. O déficit está sendo reduzido lentamente. Talvez a base de sustentação política do governador Germano Rigotto não seja suficientemente sólida para respaldar medidas mais fortes.
ZH - Por que Minas conseguiu equilibrar as contas públicas?
Busatto - No Rio Grande do Sul, governo e oposição se digladiam. Em Minas, há um ambiente de harmonia. Como o governador Aécio Neves (PSDB) será candidato a presidente em 2010, ele não está batendo em Lula e no PT. Os mineiros têm a vantagem de gastar 6% a menos com inativos e 7% a menos com outras despesas correntes. Essa é a diferença.
ZH - O prefeito José Fogaça e secretários municipais tiveram mais liderança do que o Estado para conduzir o projeto?
Busatto - Na Capital, a discussão com a equipe de Falconi começou antes de o prefeito assumir. Tivemos várias reuniões de trabalho, planejamos como seria a integração e definimos duas prioridades: as áreas de fazenda e saúde. É muito difícil baixar a despesa. A resistência em reduzir gastos é muito grande.
ZH - O trabalho de Falconi é respeitado nacionalmente. Por que ele faria críticas sem se basear em dados técnicos?
Busatto - Ele é um excelente técnico, mas errou por ingenuidade política. Ele deu uma opinião em uma hora imprópria, que foi imediatamente interpretada como parte de uma disputa política entre o governo que quer continuar e a oposição que quer derrotá-lo. Em véspera de eleição, um consultor de credibilidade deve se resguardar para não ser usado. Falconi deveria ter dito que as conclusões seriam divulgadas no final do governo. Foi horrível. O Pacto quase veio abaixo em razão da opinião de Falconi. Imagine a tensão gerada. As oposições comemoraram. O governo detestou. E eu, no meio, estou tentando encontrar um caminho de convergência.
ZH - Como o senhor tem agido para a superação dos desentendimentos?
Busatto - Foi um acidente de percurso. Como o consultor veio participar de uma atividade do Pacto, isso causou um grande estremecimento. Há dois dias, estamos discutindo o assunto e analisando se ainda é possível salvar o ambiente onde se possa pactuar medidas necessárias. Os últimos dois dias foram extremamente negativos.
ZH - Que cobranças o senhor recebeu? Afinal, o senhor convidou Falconi para fazer a palestra em Porto Alegre.
Busatto - É óbvio que sim. Ninguém esperava isso. Fomos surpreendidos porque na palestra feita a reitores não houve críticas. Ele apresentou apenas os exemplos de Minas e da prefeitura de São Paulo. Ele foi muito cuidadoso. Não sei qual a razão de ele falar tudo aquilo, que não devia ter dito, na entrevista. Quando concordamos com a vinda dele, vibramos e também nos preocupamos. Mas orientamos que era importante que Falconi não entrasse na discussão sobre o Estado e Porto Alegre.
ZH - Houve pressão do governo do Estado?
Busatto - Chegaram várias manifestações ruins e negativas que cobraram a vinda de Falconi, que acabou fazendo esse trabalho. O governo ficou incomodado com isso. Eu saí em defesa do governo porque não é o momento de crucificá-lo. O promotor do Pacto, o presidente da Assembléia, deputado Fernando Záchia (PMDB), ficou numa saia justa enorme.
Zero Hora
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