Lammel assume FAMURS
16/07/2007
Lammel assume Famurs apostando no diálogo com o Estado
16/7/2007
Paula Coutinho
O prefeito de Victor Graeff, Flávio Lammel, assumiu a presidência da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) com a disposição de valorizar o diálogo. "Vamos trabalhar para melhorar a relação federada com o Estado e com a União", afirmou Lammel, que tomou posse, em junho, para a gestão 2007-2008 da entidade municipalista. Um dos principais desafios é a negociação da dívida do executivo estadual com as prefeituras gaúchas. O assunto está sendo tratado através do recém-criado Comitê de Articulação das Relações Estado-municípios. Lammel também defende a revisão do pacto federativo. "O artigo 23 da Constituição deve ser revisado, pois é ele quem define as competências e atribuições de cada ente federado".
JC - Quais são as suas prioridades ao assumir a presidência da Famurs?
Flávio Lammel - A Famurs vai trabalhar para melhorar a relação federada com o Estado e a União. Os municípios são os grandes obreiros dos estados e da União e, para continuar este trabalho, é preciso mais receita. Atualmente, os prefeitos enfrentam muitas dificuldades. Quando foi promulgada a Constituição de 1988, os municípios recebiam em torno de 20% do bolo tributário nacional. Hoje, esse repasse fica em torno de 13%. A União se tornou, ao longo dos anos, a grande arrecadadora. Precisamos dividir melhor as arrecadações e vamos trabalhar no sentido de rever essa relação com a federação. Para termos uma idéia, em 1988 a União recebia 20% das contribuições do total de impostos arrecadados. Hoje, esse índice representa 60% dos impostos que não são compartilhadas com os estados e municípios. Precisamos trabalhar para rever essa divisão que acaba, na verdade, se tornando um imposto. Ou seja, uma forma injusta de arrecadação e distribuição dos recursos que a União criou para tapear os municípios. Aqui no Estado, também estamos trabalhando para melhorar a relação federada. Isso passa pela ampliação do diálogo entre o Executivo estadual e os municípios. Não podemos mais deixar que os municípios permaneçam em situação de guerra com o Estado.
JC - Os municípios vêm ganhando atribuições e, em contrapartida, perdendo recursos. Como equacionar essa situação através da revisão do pacto federativo?
Lammel - Defendo que o pacto federativo deve ser discutido de forma aberta e profunda. A União não pode mais defender a idéia de que certos recursos são indispensáveis. Ou ainda, de que a retirada de certos tributos vai impactar de forma negativa as finanças públicas. Precisamos redefinir as funções e atribuições de cada ente federado. Também é necessário estabelecer o que vai gerar receita para que as atribuições possam ser revistas. Os municípios nunca se negaram a prestar serviços em áreas essenciais para a população como saúde ou educação. Sabemos que essas são atribuições dos municípios, mas para continuar cumprindo com isso é preciso mais recursos. O artigo 23 da Constituição deve ser revisado, pois é ele quem define as competências e atribuições de cada ente federado.
JC - A propósito da busca pelo entendimento entre municípios e Estado, como foi a primeira reunião do Comitê de Articulação das Relações Estado-Municípios?
Lammel - Realizamos a reunião do Comitê no dia 10 de julho. E, embora tenha sido a primeira, acredito que já houve uma grande evolução. Tivemos a oportunidade de sentar com os representantes do governo estadual, que ficaram conhecendo melhor as nossas reivindicações. Criamos o Comitê de Articulação com a intenção de que ele se torne um balcão de negociações e que permita a discussão da dívida que o Estado tem com os municípios. Esse mecanismo, também pode permitir o contrário. Ou seja, que façamos a compensação nos casos nos quais a dívida é dos municípios com o Estado. Sabemos que este é um momento importante para o diálogo e estamos evoluindo neste sentido. A governadora Yeda Crusius está disposta a dialogar, e isso é imprescindível. Encaminhamos uma proposta ao Executivo estadual para o pagamento parcelado da dívida com os municípios, que atualmente é de R$ 298 milhões. Esse total abrange as áreas da saúde, da educação e da assistência social. A Famurs defende que o pagamento de R$ 40 milhões seja feito ainda neste ano. O restante, R$ 258 milhões, será negociado com os municípios. Há a possibilidade, inclusive, de que esse valor seja compensado na dívida dos municípios com o Estado.
JC - A partir desse primeiro contato, e da sinalização de que as negociações vão avançar, está descartada, pelos menos por enquanto, a possibilidade de os municípios executarem as ações judiciais contra o Estado?
Lammel - A possibilidade de os municípios levarem a cabo a decisão de entrar na Justiça contra o Estado não está descartada. Essa definição foi acertada durante assembléia-geral e está baseada na possibilidade de o Estado não apresentar nenhuma proposta concreta em relação à dívida que tem com os municípios. Mas, diante dessa nova negociação que se encaminha com o Executivo estadual, será necessário fazer uma nova assembléia. Contudo, mantemos a determinação de cada administração municipal ingressar na Justiça contra o Estado no dia 31 de julho.
JC - Como foi o seu encontro com o presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), conselheiro Sandro Pires, para tratar do auxílio técnico na negociação da dívida?
Lammel - O Tribunal de Contas do Estado não vinha reconhecendo os restos a receber na prestação de contas dos municípios. Tivemos uma reunião com o presidente do TCE, conselheiro Sandro Pires, para solicitar que, nos encontros de contas com o governo do Estado, quando é emitido um documento colocando os restos a receber, este mesmo seja aceito pelo TCE como compensação financeira das prefeituras no final do ano. Também solicitamos que os gastos com a terceirização de serviços não sejam incluídas no cálculo de despesas de pessoal dos municípios para efeito da Lei de Gestão Fiscal. Outro pedido é de que o Tribunal emita um calendário informando a data e os municípios onde serão realizadas as auditorias. Os prefeitos não têm nada a esconder e, por isso, entendemos que o trabalho pode ser desenvolvido de forma mais eficiente se o Tribunal de Contas informar as datas de suas visitas técnicas.
JC - A Famurs também tem trabalhado com o Tribunal de Contas na qualificação dos agentes públicos municipais. Como tem sido esta parceria?
Lammel - A parceria com o Tribunal tem sido muito presente, e colocamos na reunião a importância do seu auxílio. Que ele não se resuma a um órgão punitivo, mas que busque qualificar as ações diárias dos prefeitos. A maior parte das infrações que acontecem nos municípios são em função da falta de informação e orientação. Se o TCE se credenciar como um órgão orientador, e isso vem ocorrendo, temos certeza de que vamos diminuir muitos casos de infrações. A intenção é fazermos encontros em todas as associações regionais de municípios em conjunto com o TCE em busca de um debate franco e aberto com os prefeitos. A partir de outubro, vamos determinar um cronograma de ações pelo Interior do Estado. A reunião-piloto em Nova Palma trouxe bons resultados.
JC - É irreversível a decisão dos municípios de não participar da Consulta Popular?
Lammel - Decidimos em assembléia que não participaríamos da Consulta Popular nos termos em que ela vinha sendo feita. Mas houve um avanço por parte do governo gaúcho que propõe algumas alterações no sistema da Consulta. Vamos levar esta nova proposta para a assembléia da Famurs, marcada para o dia 24, para que possamos construir uma alternativa. Estamos conversando com os secretários estaduais e com os Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes) para tentarmos construir uma proposta melhor do que aquela apresentada pelo governo para o pagamento das edições de 2002 a 2006, pela qual o Executivo se compromete a repassar R$ 180 milhões a partir do próximo mês, e o restante, R$ 190 milhões, nos próximos quatro anos. O governo também informou que reservou para 2007 mais R$ 40 milhões. A idéia do Executivo também é fazer um processo de Consulta Popular voltado para os projetos regionais, já previstos no Plano Plurianual, e não mais daquela forma em que eram indicadas coisas muito pontuais. Quero destacar, que os prefeitos não são contra a Consulta. Pelo contrário, entendem que este é um instrumento importante, que conta com a participação da população para definir as prioridades das comunidades. Mas, nós, prefeitos, não queremos liderar o processo neste ano, como vínhamos fazendo em todas as outras edições, já que o governo não estava efetuando o repasse dos recursos. Os prefeitos pagam um preço muito alto. Chamamos a comunidade que define as obras necessárias, criamos uma expectativa e depois não temos o apoio financeiro do Estado para executar as demandas. O que os prefeitos querem é uma proposta que seja cumprida.
JC - A propósito da interlocução com o governo, como tem sido o relacionamento com o secretário Celso Bernardi?
Lammel - O secretário Celso Bernardi é um municipalista que trabalha no Estado. Ele tem dispensado grande atenção aos prefeitos. Acredito que a governadora Yeda teve uma grande idéia quando criou a Secretaria de Relações Institucionais e foi feliz ao encontrar uma pessoa como Bernardi para fazer essa interlocução. É lógico que estamos discutindo, mas isso faz parte da dinâmica e do processo. Vamos trabalhar em conjunto com o Estado. O Rio Grande do Sul pode dar certo e vamos fazer com que esta parceria, que começa pelos municípios, possa se transformar num grande surto de desenvolvimento.
JC - A Assembléia Legislativa constituiu a Frente Parlamentar Muncipalista. Isso deve facilitar o diálogo com o Parlamento?
Lammel - A criação da Frente Parlamentar Municipalista na Assembléia gaúcha é extremamente importante. O deputado Gilmar Sossella (PDT) teve uma iniciativa muito feliz na criação dessa frente. Queremos apoiar essa ação que deve facilitar, e muito, tanto o diálogo com a Assembléia Legislativa, quanto à articulação dos projetos encaminhados que visam aos interesses dos municípios. Um deles, apresentado ao Parlamento gaúcho, propõe uma mudança nos índices de ICMS. A Famurs propõe acabar com os índices de 1% do ICMS para a mortalidade infantil e evasão escolar. A idéia é criar um novo índice de 2% baseado no Valor Adicionado Fiscal per capita com distribuição inversamente proporcional. Ou seja, os municípios que têm um Valor Adicional Fiscal maior vão receber menos, e aqueles que têm esse valor menor receberão mais.
JC - De que maneira a bancada gaúcha, em Brasília, também poderá auxiliar nos pleitos municipalistas, inclusive na renegociação do Pacto Federativo?
Lammel - Vamos tratar da CPMF com a bancada gaúcha, em Brasília, nos próximos dias. Vamos brigar para que as mudanças que serão votadas no Congresso com relação à essa contribuição sejam compartilhadas com os municípios. Não será uma luta só nossa, mas também dos estados. Cobramos essa alteração, durante a reunião do Comitê de Articulação, com o secretário de Relações Institucionais, Celso Bernardi. A governadora Yeda Crusius também deve ser nossa parceira nesse pleito. A bancada gaúcha, que tem deputados comprometidos com os municípios, deve votar a favor do compartilhamento que segue os mesmos moldes de outras contribuições que já existem, nas quais 22,5% das receitas são repassadas para os estados e municípios.
JC - Como foi o encontro com o coordenador da representação do governo estadual em Brasília, Marcelo Cavalcante?
Lammel - Estamos criando na Famurs um banco de projetos que vai centralizar todas as iniciativas do Interior do Estado. E também vamos fazer com que a representação em Brasília seja um de nossos interlocutores.
JC - Depois dos poucos avanços na reforma política, que acabou adiada para agosto, o próximo desafio do Congresso Nacional será a reforma tributária. Quais os pontos mais urgentes que precisam ser modificados?
Lammel - Entendo que a reforma tributária deve promover a justiça tributária. Mas, como se faz isso com relação aos entes federados? É uma questão de compartilhamento de todos os tributos que o governo federal arrecada. Com isso, vamos desafogar os estados, dando a possibilidade de desenvolvimento aos municípios através dos investimentos, além de descentralizar os recursos, que hoje estão só em Brasília.
JC - Outro tema polêmico é a concessão de rodovias, assunto que, inclusive, motivou a criação da CPI dos Pedágios, na Assembléia Legislativa. Como o senhor se posiciona sobre o assunto?
Lammel - A Famurs tem acompanhado atentamente o assunto, e somos contrários à forma como os pedágios estão colocados no Rio Grande do Sul. Muitos cobram tarifas altas demais sem, no entanto, prestar um serviço que garanta, no mínimo, boas condições de uso das rodovias. Os pedágios comunitários, adotados durante a administração do ex-governador Alceu Collares (PDT), são o melhor modelo e promovem benefícios à comunidade local, que paga uma tarifa menor.
Fonte: Jornal do Comércio
Data : 16/07/2007
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