O ajuste fiscal e a "fábrica de notícias", por Aod Cunha de Moraes Junior*
15/04/2008
Não há nada mais equivocado do que separar as ações e a comunicação do governo Yeda até aqui entre a "fábrica de más notícias de 2007" e a "fábrica de boas notícias de 2008". Não existe nenhuma das duas "fábricas". O que há é um processo de ajuste fiscal em curso no setor público gaúcho com diferentes etapas que devem ser percorridas.
A primeira fase foi a do choque de realismo fiscal. Mostrar o custo do desequilíbrio das contas e a necessidade urgente do ajuste era vital para justificarmos medidas duras de redução de gastos e preservação de receitas. Se alguém ainda tem dúvida do custo do desequilíbrio fiscal ao longo de 37 anos, lembro que apenas por conta da dívida acumulada pelo Estado pagamos quase R$ 2 bilhões em 2007, contra R$ 11 milhões de investimentos com recursos livres do Tesouro. Ou seja, se tivéssemos um orçamento equilibrado, estaríamos investindo algo como 200 vezes mais do que investimos no ano passado!
A segunda fase do ajuste foi implementar um conjunto de medidas de curto prazo pelo lado da despesa e da receita que evitasse o caos financeiro projetado para o final de 2007. Mesmo num primeiro ano de governo, há um limite para a aceitação dos custos do ajuste, como no caso do tamanho do atraso da folha de pagamento. Atrasar a folha por meses, em vez de por alguns dias, poderia inviabilizar o próprio processo. Esse conjunto de medidas teria que ser adotado rapidamente e ser o mais amplo possível. Fizemos isso já em janeiro, e o conjunto de medidas adotado propiciou não só o maior superávit primário em mais de três décadas do Rio Grande do Sul em 2007, mas, principalmente, garantiu um quadro de normalidade para a maior parte dos pagamentos essenciais ao funcionamento das políticas públicas. Ainda nesta fase inicial, consolidamos dois fundos de reserva previdenciária a partir do IPO do Banrisul.
A terceira fase seria preparar um conjunto de ações de médio e longo prazos que aprofundasse o tamanho do ajuste e, mais do que isso, melhorasse a qualidade deste ajuste, compensando a não-aceitação pela sociedade do Plano de Recuperação do Estado (um conjunto de medidas que permitiria ampliar os investimentos já neste ano). Entre essas ações destaco três: a preparação de um conjunto de ferramentas para melhorar o combate à sonegação e evasão fiscal, desenvolvido pelo Departamento da Receita em parceira com o Programa Gaúcho da Produtividade e Qualidade, a reavaliação de processos e estruturas de órgãos públicos e a construção de um grande projeto de reestruturação da dívida pública com o Banco Mundial. Estas três ações tomaram todo o ano de 2007 e ficaram amadurecidas para a sua implantação em 2008.
A quarta fase, já em curso, procura projetar metas intermediárias antes de completar o ajuste final. O primeiro desses objetivos é colocar e manter a folha de servidores em dia. O segundo é repor em seis parcelas recursos sacados do Fundo de Equilíbrio Previdenciário para o pagamento do 13° salário de 2007. O terceiro objetivo é reduzir o tamanho do financiamento necessário para honrar o 13°, para que o Estado economize no pagamento desse tipo de empréstimo e invista mais. Quando conseguirmos ter a folha em dia e não tomarmos mais empréstimos para despesas correntes, poderemos aumentar os investimentos mais acentuadamente sem comprometer o equilíbrio das contas.
Obviamente, um processo de ajustamento fiscal envolve medidas difíceis que, conseqüentemente, geram más notícias - como é o caso do baixo índice de investimentos ou da contenção dos reajustes ao funcionalismo, por exemplo. Mas esse processo, das etapas 1 e 2, não correspondeu a uma "fábrica de más notícias". Da mesma forma, não existe, nas etapas 3 e 4, uma "fábrica de boas notícias", mas, sim, um conjunto de resultados que começa a ser mais bem percebido pela sociedade. O que há no Estado é um processo de ajuste fiscal, no qual, para colher benefícios permanentes, a sociedade precisa antes arcar com custos temporários.
*Secretário estadual da Fazenda
Fonte: Zero Hora
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