Editorial de Zero Hora - É urgente repensar o setor público
06/06/2008
As estarrecedoras gravações divulgadas pela CPI do Detran foram recebidas com preocupação ainda maior por parte da sociedade por demonstrarem que a roubalheira envolvendo elevadas somas de recursos públicos não se limita ao megaesquema denunciado à Justiça Federal. Um dos diálogos mais chocantes - que quase descamba para o humorístico pelo temor de um dos interlocutores de estar sendo gravado - expõe os detalhes da partilha de dinheiro mal havido numa operação alheia ao esquema. Essa é a questão central do escândalo: os recursos surripiados de um governo falido por parte da teia composta por uma elite estatal bem remunerada, associada a amigos e familiares, são os mesmos que faltam para o reajuste do servidor honesto, para propiciar mais segurança, melhor saúde e mais educação. A sociedade precisa reagir contra essa desfaçatez, pedindo um basta e um mínimo de ética, além de mais rigor nos sistemas de controle do uso de verba pública.
Ao denominar de Rodin a investigação que desvendou o maior assalto aos cofres públicos já registrado no Estado, a Polícia Federal levou em conta as ligações com o esquema criminoso da empresa de consultoria Pensant, inspirando-se na estátua mais conhecida do escultor, que mostra um homem meditando. Esse verdadeiro monumento à reflexão, portanto, é sugestivo da reação que no mínimo o episódio vergonhoso deve merecer de todos os gaúchos comprometidos com a ética e com a moralidade na área governamental. É ultrajante para a população de um Estado com tradição de seriedade como o Rio Grande do Sul ouvir alguém negociando favores no setor público e assegurando a quem está do outro lado da linha que "R$ 1 milhão fica lá pra ele, R$ 250 mil pra ti e R$ 250 mil pra mim."
A referência na gravação a um "negócio", como definiu o interlocutor, "independente daquele" sugere que os desvios não se restringem ao Detran nem aos repasses tão volumosos quanto suspeitos da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (Fenaseg), atingindo portanto outras áreas. Mas o que mais surpreende é o fato de uma quadrilha integrada por dezenas de pessoas, de dentro e fora do governo, ter conseguido subtrair volumes financeiros tão expressivos, por tanto tempo, sem que os mecanismos oficiais tivessem conseguido evitar o escândalo.
Os desfalques nos cofres públicos do Rio Grande revelam que as onerosas estruturas de fiscalização custeadas pelos contribuintes falharam de forma flagrante, por omissão, incompetência ou má-fé, o que exige mudanças radicais. A conivência reforça a importância e a urgência de se repensar o setor público. Sem prejuízo das responsabilizações, é preciso levar adiante uma profunda revisão dos caminhos do dinheiro e das mãos pelas quais circula, mas sobretudo dos organismos cuja razão de ser seria justamente zelar pelo bom uso de verbas oficiais.
EMERGÊNCIAS
Os desfalques nos cofres públicos do Rio Grande revelam que as onerosas estruturas de fiscalização custeadas pelos contribuintes falharam de forma flagrante, por omissão, incompetência ou má-fé, o que exige mudanças radicais.
Fonte: Zero Hora
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