Muito imposto e pouco retorno
Marco Sanchotene
06/09/2006
06/09/2006
Os 62 tributos básicos que existem no Brasil abocanham boa parte da produção nacional, com voracidade e velocidade cada vez maiores. O aumento na arrecadação veio do crescimento da carga tributária, que está entre as maiores do mundo, e do aperfeiçoamento na fiscalização. O problema é que os serviços oferecidos pelo governo em troca dos impostos, taxas e contribuições não suprem a demanda, o que obriga a população a pagar por serviços privados. Para o futuro próximo, a previsão é de que o Fisco fique ainda mais voraz.
De 1988 a 2005, a carga tributária brasileira cresceu 87,5% a mais do que o Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas produzidas pelo país em um ano, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). Em 1988, a carga estava em 20% do PIB.
Em 2003, a arrecadação ultrapassou R$ 553 bilhões, em 2004 atingiu R$ 650,15 bilhões e, em 2005, chegou a 37,37%, o equivalente a R$ 733 bilhões, nos níveis federal, estadual e municipal. A arrecadação foi de R$ 2 bilhões por dia, mais de R$ 83 milhões por hora, quase R$ 1,4 milhão por minuto e aproximadamente R$ 23 mil por segundo.
Ao fim deste ano, a força do Fisco deve se consagrar na marca recorde de 38% do PIB, ou quase R$ 800 bilhões, de acordo com o IBPT. É como se cada brasileiro tivesse que pagar quase R$ 4 mil ao Fisco neste ano.
Esses valores fazem do Brasil um dos países que têm a maior carga tributária do mundo, atrás apenas de nações desenvolvidos como Suécia, Noruega, França e Itália, e à frente da Alemanha, Turquia, Canadá e Espanha, que em sua maioria mantiveram os mesmo patamares de 1985 até 2004. A diferença é que nestes países, com exceção da Turquia, os tributos cobrados da população geralmente servem para o fim a que foram criados: oferecer os serviços de necessidade básica, como educação, segurança e saúde, com qualidade. Comparando-se o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que reflete as condições da educação e da expectativa de vida de um país, percebe-se que o Brasil está bem atrás dos países que cobram quase a mesma carga de tributos – num desonroso 63.º lugar.
Somente para pagar os impostos, taxas e contribuições dos governos federal, estadual e municipal, o brasileiro trabalha até o 25 de maio de cada ano. Com o aumento dos gastos em serviços privados, que substituem os insuficientes serviços públicos, o brasileiro precisa trabalhar até 23 de julho apenas para pagar escola particular, plano de saúde, segurança privada e previdência complementar. Os dados são de estudos do IBPT.
Como se já não bastasse o tempo dedicado a encher os cofres públicos, o brasileiro precisa trabalhar quase 2 meses a mais para pagar os serviços que o governo não oferece, mas deveria. Para contribuintes da classe média, o prazo é o dobro e vai até 25 de setembro. Nos anos 70, os brasileiros gastavam em média 25 dias para pagar por serviços “supérfluos”, enquanto nos anos 80 a mesma obrigação levava 44 dias. Em países onde os serviços públicos funcionam, o tempo de contribuição não muda muito. Na Suécia, os cidadãos precisam trabalhar 185 dias por ano para pagar seus tributos, enquanto os franceses levam 149 dias e os espanhóis trabalham 137 dias. Nos Estados Unidos, maior potência econômica do mundo, o tempo é ainda menor: são 102 dias exigidos dos contribuintes para que cumpram suas obrigações tributárias.
Conforme a Receita Federal, o crescimento da arrecadação no ano passado se deve à eficiência da administração tributária e à adoção de medidas legais que permitiram maior eficiência no controle, como a exigência de retenção na fonte dos pagamentos feitos a empresas prestadoras de serviços e a recuperação de débitos em atraso por conta do trabalho de fiscalização e cobrança.
No entanto, desde a edição da Constituição de 1988, o sistema tributário brasileiro passou por diversas minirreformas, que criaram novos tributos, ampliaram a base de cálculo e aumentaram a alíquota dos já existentes. “A Constituição foi uma carta branca para a criação de tributos”, diz Gilberto Luiz Amaral, do IBPT. Em 1994 foi criada a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), enquanto em 2001 foi instituída a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre combustíveis, para ficar somente nos tributos mais conhecidos.
Gazeta do Povo - Paraná
Comentário do Afocefe:
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