Reforma sindical sem sindicatos
Lourenço Prado
09/08/2006
A reforma sindical do governo Lula, protagonizada pelas cúpulas sindicais, originou as Medidas Provisórias números 293 (dispõe sobre o reconhecimento das centrais sindicais) e 294 (sobre a criação do Conselho Nacional de Relações do Trabalho — CNRT) sem que fossem ouvidas as bases representativas dos trabalhadores e empregadores. Trata-se de uma reforma sem sindicatos, artificial, irrealista, um atraso para os trabalhadores brasileiros, no seu permanente processo de luta em prol de melhores condições de vida, de salários e de empregos decentes.
A verdadeira reforma sindical teria que contar com a aquiescência dos sindicatos, obtida mediante congressos, assembléias e outras formas coletivas de ratificação do que foi concebido pelo Fórum Nacional do Trabalho (FNT), mesmo sabendo-se, de antemão, que a maioria das deliberações ali adotadas (92%) tenha sido pela manutenção da unicidade sindical e contribuição financeira compulsória, baseadas no sindicalismo por categorias econômicas e profissionais. Embora as discussões no FNT tenham se dado, como dissemos, sem consulta às bases, criou-se a falsa posição de que as cúpulas estariam interpretando os anseios dos trabalhadores. Na realidade, não estavam.
A própria reunião conclusiva dos trabalhos do FNT espelhou o viés autoritário da sua direção, que impediu vozes contrárias de se expressarem na apresentação final dos trabalhos, já que se buscava arrancar de qualquer forma o decantado “consenso”. Assim, a reforma sindical concebida pelo Ministério do Trabalho e Emprego será sempre contestada pela maioria dos sindicatos de trabalhadores. E isso retira a legitimidade de qualquer medida que for votada no Congresso Nacional, sem falarmos ainda nos aspectos que podem violar a nossa Constituição Cidadã de 1988.
Relativamente à Medida Provisória nº 293, é equivocada, data vênia, a confusão feita entre vinculação e filiação. Afinal, todos sabemos que vinculação se dá do sindicato à federação, e desta à confederação, como consta da legislação em vigor, especialmente para efeito do rateio da Contribuição Sindical, cuja execução está a cargo da Caixa Econômica Federal, de acordo com as instruções do Ministério do Trabalho e Emprego. Daí a desnecessidade e impertinência de se falar em vinculação na referida MP.
Quanto à indicação de filiação, essa sim é necessária, mas somente em relação às centrais sindicais, que são entidades multicategorias e não estão protegidas pelo princípio legal da vinculação. Se não houver a indicação feita pela entidade (sindicato, federação, confederação) à qual a central se encontre filiada, haverá prejuízo irreparável, porque a CEF não terá condições de saber para qual central creditar os valores da Contribuição Sindical.
Já sobre a Medida Provisória número 294, fazemos reparo especialmente quanto à ausência de alçada superior ao Conselho Nacional de Relações do Trabalho, da qual poderá se valer a parte irresignada com a decisão aí prolatada. O objetivo, segundo o qual todas as resoluções sejam consensuais, é louvável, mas com certeza inalcançável. E poderá submeter o conselho a um jogo de pressões intoleráveis, injustas e desnecessárias. Afinal, a experiência do FNT com os “consensos” demonstrou que, na prática, “consensos” podem ser impostos, o que não é a melhor alternativa. Recomendável seria que houvesse a possibilidade democrática do recurso para a parte que discordasse da decisão.
No mais, espera-se que essas despretensiosas considerações sejam de alguma valia para os eminentes membros do Congresso Nacional que apreciarão ambas as medidas provisórias, dentro da marcha normal dos trabalhos, levando-se em consideração as propostas alternativas e sugestões tempestivamente apresentadas pelas entidades sindicais.
Finalmente, num gesto de boa vontade e entendimento, seria recomendável que o governo retirasse do Congresso a PEC nº 369/2005 (que prevê objetivo diametralmente oposto às MPs 293 e 294).
Lourenço Prado - Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito (Contec) - lourencoprado@contec.org.br
Comentário do Afocefe:
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