O mentiroso e o ingênuo
HUMBERTO ÁVILA
16/09/2005
por: HUMBERTO ÁVILA/ Professor de Direito Tributário da UFRGS
Por favor, não me diga que você acreditou na promessa do governo federal de baixar a alíquota de 27,5% do Imposto de Renda no final deste ano. Além de ingênuo, você tem memória curta e não aprende com a história brasileira recente.
Você se lembra do IPMF - Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira, instituído em 1993 para financiar os gastos com a saúde? Pois é, ele não só foi sendo prorrogado sucessivamente até ser transformado em contribuição - a maldita CPMF, cobrada, aliás, até hoje -, como seus recursos, desviados para o caixa único da União, não são destinados ao financiamento dos gastos com a saúde. Mentiram duas vezes, e você acreditou duas vezes.
Você se recorda da promessa de correção da tabela do Imposto de Renda, que não é corrigida integralmente desde 1996? Pois é, o governo federal propôs uma correção pífia há alguns anos e, desde então, vai empurrando com a barriga sua promessa, enquanto os contribuintes que não deveriam pagar nada são obrigados a pagar 15%, e os que deveriam pagar 15%, terminam pagando 27,5%. Iludiram-no mais uma vez, e você deu crédito de novo.
Você tem lembrança daqueles benefícios dados aos empresários para usar créditos de imposto sobre circulação de mercadorias quando adquirissem mercadorias para uso ou consumo do estabelecimento para, com isso, pagar menos impostos? Pois é, primeiro deram esperanças aos empresários de que seus direitos poderiam ser fruídos a partir de 1998, mas um pouquinho antes disso foi feita uma prorrogação para o ano de 2000, logo seguida de uma outra postergação para 2003 e de uma outra ainda para 2007. Enganaram você duas vezes, e você abonou nas duas situações.
Você tem na memória as promessas do governo federal de que iria propor uma reforma tributária para simplificar e reduzir a tributação? Essa é campeã: a tal reforma não passou de um remendo fiscal e, em vez de simplificar, complicou e aumentou a tributação. Só com a prorrogação da CPMF e com o aumento das contribuições sociais, a receita do governo federal aumentou em vários bilhões.
A esses casos poderiam ser somados muitos outros. Todos eles têm dois sujeitos em comum: um mentiroso e um ingênuo. O mentiroso é o governo. O ingênuo é o contribuinte. Um vive à custa do outro, literalmente. Mas ambos precisam cair na real antes que a real caia em cima deles, tirando voto do primeiro e o dinheiro do segundo.
Fonte: Zero Hora
Data: 16/09/05
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