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Governo e Congresso têm comportamento autista

Renato Lessa

16/05/2005
O cientista político Renato Lessa afirma que governo e Congresso agem de forma autista e predatória. A lógica do Executivo e do Legislativo, diz ele, é de uma dupla e simultânea captura: um tenta ocupar cargos na administração, o outro, conquistar maiorias. "O país está aprisionado a uma agenda medíocre, minúscula", diz o professor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro. A resposta, diz, virá das galerias: "Se essa agenda ficar por muito mais tempo confinada à relação entre esses dois atores, a sociedade de alguma maneira vai tender a ultrapassar essa agenda. É difícil pensar a sustentabilidade indefinida de um padrão autista".
Folha - Qual a dimensão da perda do comando político do Congresso pelo governo? Renato Lessa - Existe descontrole de articulação, mas há algo mais importante: o país está aprisionado a uma agenda medíocre, minúscula. É como se o mundo se resumisse às relações entre Executivo e Legislativo. Na perspectiva do governo, a principal tarefa é controlar o Legislativo. Do ponto de vista do Legislativo, a racionalidade é o que tem de fazer para obter mais vantagens no acesso ao governo. Os dois configuram um sistema autárquico em que as únicas relações relevantes são as entre os dois Poderes. É como se não existisse mundo exterior.

Folha - Mas isso se dá por quê? Por falta de projetos? Lessa - Isso vem do padrão que a política brasileira adotou nos últimos 20 anos. Começa com o governo Sarney. Na transição para a democracia, o Congresso teve papel fundamental, a transição foi feita lá dentro. Na verdade, significou a captura do Executivo pelo Congresso. Isso que meus colegas chamam de presidencialismo de coalizão, de forma elegante, na verdade é uma prática predatória. Do ponto de vista dos parlamentares trata-se de uma estratégia de assalto ao Executivo. E desse, de obter maioria parlamentar. Não é falta de projeto. Nesse tipo de relação, nenhum projeto pode vicejar. Tendo ou não tendo projeto, não fará a menor diferença. As relações estão completamente contaminadas.

Folha - Isso é mais grave hoje? Lessa - Parece mais grave hoje pelo fato de esse governo não estar tendo o comando das articulações parlamentares, mas não há nada de novo quanto ao padrão de relação. Esse padrão passou pelo governo Sarney, quando se falava em ingovernabilidade todo dia; o governo Collor caiu não só pelas características patológicas e venais do presidente, mas também porque não tinha quem o defendesse no Congresso; o governo Fernando Henrique articulou isso muito bem durante oito anos e esse padrão de relação continua.

Folha - O que distingue a articulação de FHC da de Lula? Lessa - Primeiro, a própria confusão interna do PT. A eleição do Severino mostrou isso. Como é que o partido do governo vai para a eleição da Câmara com dois candidatos? Isso vai para o Guiness Book. Não há registro disso em outro país. O PT não demonstrou capacidade de operar no Legislativo nesse padrão cultural.

Folha - Tal padrão é modificável? Lessa - A modificação, se vier, virá de fora para dentro. Machado de Assis sugeria que a gente olhasse o Legislativo do ponto de vista das galerias. Se essa agenda ficar por muito mais tempo confinada à relação entre esses dois atores, a sociedade de alguma maneira vai tender a ultrapassar essa agenda. É difícil pensar a sustentabilidade indefinida de um padrão autista. O que vai acontecer daqui para a frente é a construção progressiva de um ponto de vista das galerias. A avaliação externa do Congresso vai tender a ter mais voz, mais visibilidade. É uma coisa alucinada que o ponto de tensão do dia seja o aumento dos servidores do Legislativo, de 15%. Há uma agenda concreta, urgente, do país, que vai das estradas esburacadas à reforma universitária, e ela não entra. Essa agenda substantiva não está no proscênio.

Folha - FHC afirmou que "o povo olha para o Congresso e não se sente lá". É isso mesmo? Lessa - Temo dizer que isso aconteceu no governo dele. Talvez fosse interessante como autocrítica, embora seja verdade. Por várias razões. Pela própria matemática eleitoral, você tem uma maioria expressiva de deputados que são eleitos com sobras, transferências dos mais votados.

Folha - Ele também disse ver riscos de uma crise semelhante à ocorrida no governo João Goulart. Lessa - É uma ameaça retórica. Essa crise atual nada tem a ver com o quadro do Goulart. Qual era? Uma agenda golpista explícita da direita, que não foi criada em 64, mas foi contemporânea de toda a República pós-46. Agenda de radicalização política pela esquerda. Cadê? Quem é que está propondo reforma na lei e na marra hoje? Ninguém. O PT domesticou a esquerda e a trouxe, quase toda, para o centro. Os militares estão quietos. A radicalização social é pontual. Há quem acredite que para entender a política é preciso entender a relação entre Executivo e Legislativo. É uma visão autista. Para quem pensa assim, o governo Goulart caiu porque perdeu a sustentação parlamentar, mas não leva em conta o que acontecia no ambiente social. Porém o Fernando Henrique é um sujeito extremamente inteligente. Ele não tem essa visão intelectualmente tacanha. Sabe que não é assim, mas, como ator político, ele age como se fosse isso. E a partir dessa dificuldade, chama o fantasma do governo Goulart. Não era para ele dizer isso. É discurso tático. Moralidade política é difícil. Ele está agindo na perspectiva florentina. É Maquiavel puro.

Folha - E os problemas legais de Romero Jucá e Henrique Meirelles? Lessa - Isso envenena mais ainda a agenda do Executivo com o Judiciário. Engraçado o procurador da República, homem indicado pelo Lula, agir assim. É impressionante o grau de desarticulação. Saímos do "engavetador-geral" para o "desengavetador". Um governo que vai dividido à eleição da Câmara e põe na Procuradoria um homem que age autonomamente, movido por sua moralidade e suas crenças religiosas. Como é que pode um negócio desses? Fonte: Folha de São Paulo Data: 16/05/05

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